Coach do Coach

Os melhores profissionais e as melhores equipas têm um denominador comum: serem peritos nas competências intra e inter que perfazem as relações interpessoais entre todos os objectivos, as ferramentas e os meios.


segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Artigo de Jorge Araújo

Formar e preparar equipas vencedoras. Algo que pede capacidades extremamente exigentes, seja no desporto, seja nas empresas. Como consegui-lo?

Liderar jogadores, para que trabalhem em equipa, constituiu sempre um desafio de enorme complexidade e exigência. Todo o ser humano tem como objectivo principal a sua afirmação individual e só depois – se o mobilizarem nesse sentido – será capaz de se concentrar nos interesses colectivos. O que ilustra como é difícil tentar aperfeiçoar interacções pessoais e técnicas entre indivíduos cujos objectivos particulares estão muitas vezes longe de ser compatíveis.

«O que ganho eu com isso?», perguntavam-me os jogadores. Questão central… Precisava de convencê-los de que, através da equipa e do respectivo sucesso colectivo, cada um deles teria algo de significativo a ganhar. Tinha de conseguir fazê-los interiorizar que, contribuindo individualmente para que o todo fosse maior do que a soma das partes, retirariam daí o retorno positivo que almejavam.

Como consegui-lo? Potenciando a mobilização das vontades individuais ao serviço do colectivo. Se nunca os abandona a motivação respectiva, na defesa dos interesses individuais, então teria de ser capaz de conseguir que, atingindo a equipa os seus objectivos, cada um dos jogadores ganhasse com isso algo de significativo.

Se cada jogador era tão sensível ao facto de ter de ganhar algo, sempre que se entregasse ao colectivo, cumpria-me ser capaz de me ajustar às diferenças que revelavam, ver a minha autoridade reconhecida mais do que imposta e possuir em cada momento da vida das equipas que dirigia uma visão clara do que pretendia alcançar a nível individual e colectivo.

Tinha forçosamente de me adaptar e de conseguir potenciar os constantes fluxos e refluxos motivacionais provocados pelos egoísmos dos jogadores, na busca de uma fundamental coesão de processos e de uma necessária relação social e também de uma identificação colectiva.
Uma sincronização dos movimentos colectivos e individuais e clareza na definição e na coordenação de tarefas de cada jogador.

Profundos laços sociais e afectivos, potenciando uma cooperação e uma entreajuda sem reservas de qualquer espécie. Um alinhamento claro de todos os jogadores ao serviço dos objectivos colectivos a atingir e fortes sentimentos de orgulho de pertença à equipa.
Todos os jogadores que conheci – naturalmente uns mais do que outros – debatiam-se entre afirmarem-se individualmente e o prazer de fazerem parte de uma equipa com a qual se sentissem envolvidos.

O que, em complemento do que já ficou dito para trás, permite concluir que reside nesta aparente contradição um dos mais apaixonantes aspectos de tudo o que diz respeito ao trabalho em equipa. Por um lado, somos uns inveterados egoístas; por outro, temos o desejo constante de fazer parte de um colectivo que nos complemente e que nos dê espaço quanto baste para, através dele, também nos afirmarmos individualmente. De entre os jogadores que comigo trabalharam, os que fizeram a diferença para melhor foram precisamente aqueles que sabiam utilizar a equipa e os seus resultados como uma oportunidade de afirmação e desenvolvimento pessoal.

As competências comportamentais desses jogadores e a forma como se relacionavam com os restantes foram atributos que os distinguiram no modo como contribuíam para a equipa sem nunca se deixarem diluir totalmente no interesse colectivo. Eram maduros, seguros, confiantes, preocupados com os outros, sempre capazes de estabelecer laços de confiança com todos os que os rodeavam.

Geriam bem as suas emoções sob pressão, contribuíam pela positiva para o desenvolvimento de dinâmicas na equipa ao serviço do aumento da respectiva eficácia. Tinham uma constante atitude positiva e influenciavam a equipa de modo marcante. Por sua vez, em termos colectivos, onde é que registei diferenças no que respeita às equipas com que alcancei sucesso?

As diferentes personalidades nelas existentes complementavam-se e completavam-se. Nelas existiam afinidades que lhes potenciavam as acções em comum, funcionando quase sempre numa simbiose perfeita entre estarem focadas nas tarefas e nos objectivos comuns a alcançar e, em simultâneo, estabelecerem fortes laços de inter-relação social. Demonstravam índices de coesão acima da média e davam respostas diversificadas às naturais dificuldades impostas pelo confronto com a realidade.

Formar e preparar equipas vencedoras foi naturalmente um dos meus objectivos ao longo dos anos. E para o conseguir fui percebendo a partir de uma certa altura que me eram pedidas capacidades extremamente exigentes. Para além de o facto de ser treinador me ter exigido uma mudança profunda do meu comportamento. Quem joga são os jogadores e não o treinador, razão pela qual tive de assumir como objectivo principal que os jogadores fossem autónomos e capazes de se auto-disciplinarem, auto-motivarem e auto-prepararem.
Tal como aprendi, com o passar dos anos, que não há qualquer aparente contradição entre a necessidade que o treinador tem de legitimar e valorizar a sua função e a percepção gradual que vai adquirindo ao longo do tempo; a de que o rendimento da sua equipa, num certo sentido, melhora quanto mais os jogadores menos dele precisem.

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